22 de outubro de 2012

Fechou a Escola em Grijó (A. M. Pires Cabral)


Dantes ouviam-se as crianças a caminho da escola

e eram como pássaros de som nas manhãs de Grijó.

Não eram muitas, mas as vozes joviais

davam sinal de que a aldeia resistia,

continha à distância o deserto que a ronda.


Agora as crianças, todas as manhãs,

são acondicionadas como mercadorias

numa viatura com vocação de furgoneta.

Lembram judeus em vagões jota

a caminho de Auschwitz.

Vão aprender em terra estranha o que os seus pais

e os pais dos seus pais aprenderam em Grijó.


Só se voltam a ouvir ao fim da tarde

quando a viatura as despeja no largo da aldeia

como artigos que ficaram por vender.

Mas ouvem-se pouco, porque vêm cansadas.

Ouvem-se pouco e triste porque o seu dia

- que devia ser dia de Grijó –

foi deportado para outra terra onde

não lhe firmam as raízes.


O senhor ministro das Finanças está contente,

porque poupa meia dúzia de euros

Com a violenta trasfega da infância.

Mas está triste Grijó, porque já não ouve

as suas aves da manhã a caminho da escola

- e por isso pode dizer-se que a aldeia encolheu,

ficaram uns metros mais perto as areias de amanhã.


Caladas as vozes tagarelas das crianças,

nos dias de Grijó poucas mais se ouvem

do que as de alguns velhos que antecipam

em palavras raras, conformadas,

o dia em que o silêncio cobrirá com estrondo

o (des)povoado definitivamente.


O senhor ministro das Finanças terá poupado

mais alguns euros com a instauração

deste opressivo silêncio final,

e ficará contente. Grijó não.


A. M. Pires Cabral

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